O texto não é meu ... encontrei-o no Espresso, mas dá que pensar.
"Algo mais que uma perdiz
Uma certa elegância na Assembleia da República não me choca nada, muito menos em jantares oficiais ou recepções que nos tragam contrapartidas financeiras externas. Mas na cantina? Isto é de bradar aos céus. É por este género de modos de estar e de viver com dinheiros públicos que se nota o desfasamento que existe entre a decência e a moral dos deputados portugueses em relação à situação financeira do povo.
Não sou nada miserabilista no sentido em que "se eu estou mal os outros também têm que estar", tão típico na sociedade portuguesa. Não vivemos em comuna, vivemos numa sociedade em que os cidadãos são livres de construírem ou tentarem (por muito difícil que seja) o capital que conseguirem e que possa ser seu por direito. O camarão que eu comprar é com o MEU dinheiro, certo? Claro que agora compro mais cavalas que robalos.;)
A perdiz e o porco preto num país sem dificuldades financeiras não me chocaria. No entanto, tendo em conta a situação em que nos encontramos, ver ementas destas e tentar não verbalizar publicamente o nojo e o asco que sinto, através de uma linguagem digna de pôr os serviços secretos portugueses a mandarem a PSP identificar-me, é tarefa árdua.
No Solar de Montemuro fazem as melhores papas de perdizes do Mundo. Adoro. No tempo em que podia, que já lá vai. Ainda há poucos anos poderia ir à Pizza Hut (restaurante) todas as semanas, ir ao cinema todas as semanas, comprar jogos PSP aos meus filhos uma vez por mês, meter-me no carro ao sábado (detesto sair ao domingo) e fazer quilómetros e quilómetros por este país fora, jantar uma vez por semana no meu restaurante preferido da Ribeira, o Ora Viva, e deixar umas dezenas de euros numa boa açorda e um bom vinho.
Agora tiraram-me as dezenas de euros. Graças a Deus como muito bem em casa e dispenso (com saudades) a açorda de marisco no Ora Viva. Os jogos para os miúdos vêm da banda larga e os passeios às aldeias mais longínquas de Portugal estão adiados. Salvo em algumas exceções, a pizza ultracongelada substituiu a Hut e fazem-se maravilhas com o racionamento inteligente da minha namorada sobre o orçamento (arranjem uma totó de Matemática, confiem em mim - não só se transformam em mulherões fantásticos, como dão imenso jeito nas finanças domésticas). Aos 38 anos, com uma licenciatura e no mercado de trabalho há 12 anos, deveria estar bem melhor na vida.
Aos 38 anos como em casa dos meus pais três vezes por semana e eles conseguem agora, que deveriam ter paz e sossego, contribuir mais para o meu bem-estar e o dos meus filhos que eu próprio. Nós sentimos agora aos 30 e aos 40 anos aquilo que os nossos pais sentiram aos 20 ou antes para iniciarem as suas vidas.
Os nossos pais sofreram imenso para conseguirem o que têm hoje. Mas reparem: a progressão natural seria os filhos conseguirem mais do que os pais, os netos mais do que os avós. Estamos a passar por uma situação de inversão violenta da progressão natural financeira do que seria um país em desenvolvimento. Somos chamados a fazer sacrifícios, daí que me choque tanto a ementa da AR. Choca-me imenso a ideia de imaginar, numa cantina de dia-a-dia, em Portugal, um deputado a degustar um peito de perdiz ou pombo torcaz e a dizer ao comensal que o acompanha "O povo português tem que fazer sacrifícios."
terça-feira, outubro 09, 2012
Subscrever:
Mensagens (Atom)